10 January, 2009

"Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no pecado
-muito menos no Anjo rebelado
e os encantos das suas seduções,
não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse padre, eu citaria poetas
(...)
Porque a poesia purifica a alma
...e um belo poema — ainda que de Deus se aparte —
um belo poema sempre leva a Deus!"
Mário Quintana

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Do DN
Uma família inglesa com uma alteração genética congénita que leva ao aparecimento praticamente certo de cancro da mama.
A mutação do gene BRCA1 já assolara toda a família do pai. Devido à hereditariedade da doença, avó, mãe, irmã e prima da parte do pai da bebé, já haviam sofrido de cancro da mama. Apesar de desejarem ter um filho, o casal também queria garantir a saúde da criança e quebrar a transmissão da anomalia genética. Dirigiram-se assim à consulta de fertilidade do médico Paul Serhal, no hospital do University College, em Londres, onde acabaram por ser aconselhados a realizar um diagnóstico pré-implantatório . Este processo, explica João Lavinha, geneticista do Instituto Ricardo Jorge, dá-se "no contexto da fertilização in vitro. Retiram-se vários óvulos e produzem-se embriões. Espera-se uns dias até haver uma maior divisão celular e retira-se uma célula a cada um. Depois analisa-se se o gene mutante está presente e implantam-se os embriões que não têm esse gene".Deste modo, consegui-se assegurar que a menina inglesa nunca sofrerá de um cancro devido à mutação do BRCA1.
Nasceu ontem, em Londres, o primeiro bebé seleccionado geneticamente para não herdar um gene mutante que conduz ao desenvolvimento do cancro da mama.
Qual é a polémica?
Até agora, é mais ou menos consensual essa manipulação para doenças de infância mas não para doenças que aparecem mais tarde.
O atraso de Portugal, e do resto do mundo, "deve-se ao Reino Unido ter sido o primeiro país a aprovar o diagnóstico pré-implantatório para doenças tardias" revela o geneticista. Segundo Manuel Teixeira, esta é uma decisão polémica, porque a técnica que envolve seleccionar embriões, sacrificando parte deles, "para uma doença que só vai aparecer dentro de 20 ou 30 anos" levanta questões éticas. Por enquanto, os laboratórios nacionais limitam-se a intervir apenas quando existe uma história familiar de doenças, que surgem logo na infância, como a fibrose quística ou a doença dos pezinhos.
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E agora? A manipulação genética está aí. Pondo de parte a questão religiosa que, perdoem-me a honestidade, é a que menos me interessa além de fastidiosa, outras questões se podem colocar, essas sim bem mais perigosas. A eliminação de doenças de índole genética ou mal formações graves é a vantagem mais gritante desta tecnologia. Imaginar um mundo sem cancro, alergias, asma, trissomia ou outras doenças geneticamente transmissíveis é sem dúvida um mundo ideal. Quanto a isso, penso que ninguém discordará. Depois, levantam-se as questões legais e as fugas possíveis a esses limites. Ou seja: Num sistema perfeito, casos como o descrito só seriam possíveis nos termos em que foram, após exaustivamente estudadas as indicações e os benefícios, aplicado sob legislação rigorosa. A questão é...... até que ponto o percurso cientifico e os meios implicados poderão transformar-se em serviços prestados? Explico: o drama que se nos coloca é, estando a técnica disponível (nunca esqueceremos a bomba atómica) haverão sempre países sem qualquer tipo de preocupação legislativa, ou individualidades, ou os dois, prontos a investir subsídios chorudos num qualquer laboratório menos escrupuloso, que posteriormente garantirá, a quem pague bem, estas manipulações. E não é só a desigualdade socio-económica que me preocupa porque, não sejamos ingénuos, essa já existe; quem quer saúde paga-a e em termos globais é dramaticamente assim. Não é bem isso. São as "exigências" possíveis ao sabor da loucura de quem tiver dinheiro. Estou propositadamente a levar a situação ao limite mas, também não devemos esquecer que no caso da bomba atómica a humanidade se auto regulou, ou seja, percebeu com o que estava a lidar e não mais se "atreveu". No fundo, tenho esperança que assim também aconteça neste caso. A medicina avança e muito todos os dias, para níveis que o comum cidadão nem imagina e há felizmente uma tendência para o bom senso além de uma censura forte da comunidade cientifica do que foge aos limites do admissível (por exemplo, as praticas terceiro mundistas do foro da cirurgia plástica). A sociedade global tem-se auto-regulado com algum sucesso e acredito que assim continuará. Seria bom, porque os benefícios são indescritíveis, que pudessemos acreditar nesse mundo novo e mais saudável.